Frei Almir Ribeiro Guimarães, OFM
O que me importa na vida de Francisco é o que ela nos traz, sua mensagem para hoje. Numa vida, nem tudo tem a mesma importância. Nem tudo é igualmente original e criador. Há na vida de Francisco aspectos que refletem pura e simplesmente seu tempo. Ele pertenceu a uma época e por ela foi marcado. Mas o que me interessa nele é o homem do futuro, o homem que vê além do seu tempo. É a amplitude de sua visão que ultrapassa os limites de uma época. Tomás de Celano, seu primeiro biógrafo, escreveu: “Parecia um outro homem, um homem de outro mundo” (1Cel, 82). É este homem que me interessa profundamente. Que luz traz Francisco para os graves problemas que vivemos hoje? Ele cuja vida inteira foi inspirada por um grande impulso de fraternidade, o que tem a dizer-nos, a ensinar-nos sobre a questão essencial: como chegar a uma verdadeira comunidade humana? Por que nossa civilização parece ter fracassado até hoje? E isto apesar de sua inspiração cristã e humanista ( Éloi Leclerc, O sol nasce em Assis, p.52-53).

2. Os que buscam seguir o Evangelho à maneira de Francisco são pessoas que andam antes de tudo desejosas de seguirem Jesus. Querem responder a um apelo do Mestre. Em nossos dias, na formação inicial e permanente não se pode fazer economia de um sério estudo do Documento de Aparecida (CELAM). Ali se insiste na formação do discípulo missionário: encontro pessoal e profundo com o Cristo ressuscitado; enveredar pela trilha da conversão, da transformação a tal ponto que o amargo seja doce e o doce, amargo; viver em íntima comunhão com Cristo ressuscitado e presente na Igreja e o mundo; sair em missão. Todo cristão haverá de percorrer estas etapas que, muitas vezes, se entrelaçam. Os franciscanos seculares não fazem economia desta formação de base. Os que se aproximam da Ordem são pessoas que desejam ser discípulos missionários à maneira de Francisco e de Clara (cf. Documento de Aparecida: O processo de formação dos discípulos missionários, 276- 285, particularmente n. 278).
3. Desnecessário dizer que vivemos um tempo de instabilidade e de mudanças profundas na sociedade, a Igreja, em nossa Ordem. É sempre uma decisão de bravura querer hoje dar orientações na formação humana, cristã, franciscana e missionária. No momento em que vivemos as coisas parecem ter gosto do provisório. Precisamos aprender a viver na intempérie. Quais as configurações de nossa fraternidade secular amanha? Um autor, refletindo sobre a temática da vida religiosa consagrada, assim se exprime: “Nosso destino nesses tempos fragilizados de transição e de incerteza é aprender a viver a espiritualidade do êxodo e da intempérie. Nossa atitude de base é a de sofrer a incerteza, perseverar na insegurança. Sinal de maturidade que aprendamos a suportar a perplexidade, sem adotarmos uma posição de defesa, nem de incorrer na resignação e amargura. É sadio aprender a viver na intempérie, na incerteza, sem ceticismo nem desespero. É sinal de maturidade desaprender muitas coisas, deixar cair o que não tem futuro e não os aferrarmos ao passado. É sadio viver abertos e dispostos ao futuro de Deus no mundo, na Igreja, na Vida Religiosa. É sadio, sobretudo, reaprender a simplicidade da confiança simples, a esperança nua” (José Arregui, OFM, Ante el futuro de la vida religiosa, in Lumen (Espanha) 2001, p. 201-202). Não existe diploma para os que fizeram parte da caminhada. Tudo precisa ser refeito. A formação é permanente. Trata-se, como se disse, de uma espiritualidade do êxodo e da intempérie. Necessário é seguir em frente. Uma palavra forte: coragem. Uma preocupação: procurar águas mais profundas. Quais as marcas características da OFS nos próximos anos.
4. Numa sociedade que duvida de tudo e de si mesma, que tem uma visão “desencantada” do mundo, exprimindo indiferença e por vezes mesmo menosprezando os valores morais e cristãos será fundamental mostrar confiança no futuro. O Evangelho não pode ser um texto que descansa em folhas de papel ou arquivos do computador. Formandos e formadores ficarão atentos para descobrir em direção o Espírito anda soprando.

6. Cada irmão que ingressa na Fraternidade precisa ter em mãos as rédeas de sua vida. Ele é o primeiro responsável por sua formação.
Os que nos procuram desejam buscar o seguimento de Cristo e de seu Evangelho, e consequentemente, perseguem a santidade de vida. Não querem a superficialidade e a mediocridade.
7. No campo da formação não basta apenas ilustrar a mente com elementos doutrinários da fé e da tradição franciscana. Os que chegam (e os que já estão) se identifiquem com esse movimento de renovação evangélica. Nunca é demais, nesse contexto, voltar ao tema da identidade franciscana.
8. Será importante trabalhar valores humanos: maturidade, coragem, clara consciência do que vem a ser assumir compromissos, superar o universo dos melindres e suscetibilidades, capacidade de conviver com o diferente. Os formadores atentarão para que não seja feita uma formação marcada por meros “devocionalismos”. Será preciso estudar, e estudar de verdade, ler, inventar tardes de estudo, ler os textos franciscanos fundamentais.
9. A formação franciscana vai na linha da impregnação de valores que marcaram Francisco e Clara: postura de simplicidade, vida despojada, gosto pela fraternidade, vontade de não se sobrepor aos outros, senso de partilha, trabalhar sem perder o espírito das devoção, não perder o Espírito do Senhor, ir pelo mundo e ter saudade do eremo, exercitar-se constantemente na práxis da desapropriação, ter o gosto pelas coisas modestas, tomar distância do consumismo, saber degustar as coisas interiormente.




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