quarta-feira, 28 de setembro de 2016

Especial - O fascínio de São Francisco de Assis


 O cosmos e os símbolos

Por N.G. Van Doornik

O nosso mundo ocidental perdeu este sentido do cosmos. Esvaziaram-se muitos símbolos que durante milhares de anos falaram ao homem, como intérpretes do “mundo atrás das estrelas”.

À medida que a técnica elimina a necessidade de evocar em símbolos o mundo invisível, o poeta é substituído pelo homem de ciência. Mas para aquilo para que este necessita de uma pesquisa minuciosa, o poeta emprega, às vezes, uma única palavra.
O mesmo se dá com o místico que, com uma única imagem, faz com que o homem fique ciente de uma realidade religiosa, ao passo que o teólogo tem que recorrer a uma quantidade de noções.

E numa Igreja – penso eu – em que a quantidade de noções elimina a simplicidade religiosa, a confusão a respeito da fé não está mais longe.

De outro lado, a teologia deve ter cuidado com o simbolismo. A imagem religiosa pode apresentar-se – literalmente ou figurativamente – como realidade. A arte plástica, inclusive a verdadeira arte da Idade Média e da Renascença, proveu a imaginação popular de representações em que os mistérios da fé foram “sonhados”.

Dessas representações partiu, é certo, uma grande força, mas não raro elas causaram desvirtuamento. Os símbolos tornaram-se concepções infantis da fé. A crise aconteceu, sobretudo, quando a ciência profana e a religiosa começaram a demonstrar que essas representações não exprimiam a realidade em sentido científico.

E não poucas vezes foram rejeitados, com os símbolos, também os mistérios simbolizados.
Hoje em dia esforçam-se muitos por uma extrema sobriedade, principalmente no oculto. Mas quem compreende o valor simbólico do Cântico do Sol, pergunta a si mesmo se não vamos parar no outro extremo, num vazio, em que o mistério só é experimentado por meio de conceitos.

O homem religioso não pode prescindir do símbolo, em que o divino é focalizado. “No vácuo” é-lhe impossível respirar.
Quando o nosso culto religioso se reduz a simples palavras, desaparece a atmosfera mística e muitos terão saudades das catedrais, das abadias e das antigas formas de liturgia, em que se oferece uma atmosfera sagrada.

Eu ousaria dizer: quando uma criança só sente aborrecimento com o culto litúrgico, é um sinal de que se perdeu alguma coisa das formas sensíveis e indispensáveis que com o tempo se haviam introduzido em nossa liturgia.
Já que em nosso mundo ocidental o símbolo está perdendo o seu valor, deve-se fazer uma diagnose não só do símbolo, mas também do mundo ocidental.

A vida de Francisco está marcada pelo símbolo. O símbolo era para ele uma contínua celebração do cosmos em Deus. E quando seus olhos não mais podiam suportar o clarão da luz e ele jazia enfermo numa pobre choupana, ainda pôde cantar do irmão Sol, irradiante de esplendor: “De Ti, ó Altíssimo, ele é imagem”.

Texto extraído do livro “Francisco de Assis, Profeta de Nosso Tempo”, de N.G. Van Doornik

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