sexta-feira, 17 de março de 2017

OFS: Uma formação que motive e acenda a chama.



Ordem Franciscana Secular
Capítulo Ordinário Avaliativo
Campo Largo, PR
17 a 19 de março de 2017
Tema: “Franciscano secular: revisitar o seu interior em vista da missão”
Lema: “Uma formação que motive e acenda a chama”

FORMAÇÃO NA ORDEM FRANCISCANA SECULAR
O que é, objetivos e desafios
Os franciscanos seculares do Brasil se reúnem em Campo Limpo (PR) para a realização de capitulo avaliativo. O lema escolhido propõe que aos seculares seja oferecida uma formação que motivadora do ser gente, ser cristão, ser franciscano. Sugere que tal formação acenda uma chama nova.

Frei Almir Ribeiro Guimarães, OFM, Assistente nacional pelos Menores

 A pessoa necessita de um solo vital sobre o qual possa construir com coerência seu próprio relato, assentar suas fidelidades e compromissos pessoais. Sem isso sua biografia se resume num somatório de acontecimentos pessoais desconexos e soltos. Fundar a pessoa, ajudá-la a conseguir esse solo pessoal, deve ser o grande objetivo dos processos educativos.

Patxi Álvares de los Mozos, SJ


1. Em sua origem a palavra “formar” significa dar uma forma, esculpir alguma coisa segundo um modelo preestabelecido. Os objetos copiados de um mesmo modelo são iguais uns aos outros. As coisas se passam diferentemente quando se trata de pessoas. Não fazemos clones. Cada pessoa é única em seu patrimônio genético, em sua história, a partir das experiências vividas ao longo da vida, história única aos olhos de Deus. Formar uma pessoa significa, antes de tudo, acompanhar seu crescimento humano e, em nosso caso, cristão e franciscano. A formação demanda tempo. Se queimamos etapas o fruto não amadurece. A formação propõe ao formando instrumentos que permitam seu crescimento. Evidentemente a formação é transmissão de conhecimentos, mas ela passa também pela vida. Trata-se de partilhar experiências e viver ou vivenciar encontros. Uma iniciação na oração será fundamental para que tudo seja interiorizado, assimilado. Assim, o processo formativo da pessoa, do cristão e do franciscano é complexo e leva tempo para atingir seu objetivo. Não se resume às tinturas apenas na formação inicial. Deus continua agindo nas pessoas ao longo de sua vida e será preciso vigilância. Daí a importância de uma formação ininterrupta.

2. Será que se pode definir a formação cristã? Trata-se do conjunto de elementos usados para que a pessoas façam aflorar as riquezas pessoais que a vida lhes deu, que venham a fazer um encontro pessoal com o Deus vivo e seu Cristo, que entrem num processo de conversão e de adesão ao espírito do Evangelho. Formação tem a ver com evangelização da pessoa, catequese, acompanhamento espiritual, convite à leitura, iniciação na meditação, capacidade de superar o negativo da vida e respirar, no dia a dia, o espírito do Evangelho. A formação faz com que a pessoa viva o presente com os olhos fitos naquilo que ainda não conseguiu. Leva a tornar a pessoa madura e o cristão, um santo.

3. A formação é um processo que dura a vida toda. É obra que precisa sempre ser retomada. Tem tudo a ver com uma educação permanente. Leva a pessoa a se confrontar com sua verdade pessoal, detectar entraves e curar feridas do passado. Mostra caminhos que levam a uma plena realização do educando como pessoa, dono de sua história, como discípulo do Ressuscitado, como seguidor do jeito de viver de Francisco e suscita o desejo ou a urgência de ser sal da terra, luz do mundo e fermento na massa. A formação nada tem a ver com o incentivo de devocionalismos laterais. Ela será marcadamente cristocêntrica. Formar uma pessoa, no caso de um franciscano secular, é acompanhá-la em seu crescimento humano, espiritual e franciscano. A formação comporta ensino, partilha e oração.

4. Lembramos alguns dos agentes de formação. O primeiro deles é o próprio formando. Os irmãos precisarão ficar atentos à ação do Espírito em sua vida pessoal, na Igreja e na fraternidade. Cada irmão é o primeiro formador de si mesmo. Trata-se de tomar a decisão de caminhar na trilha cristã-franciscana. Leitura, fidelidade aos encontros da fraternidade, busca de orientação pessoal e mesmo de uma direção espiritual. Há o formador e sua equipe. Não é aqui o lugar de traçar demoradamente do perfil do formador: seriedade, competência, vigilância, saber escutar, corrigir fraternalmente… Formadora é a fraternidade com o conjunto dos irmãos que dão o testemunho de busca da santidade. O formando haverá de fazer constantes revisões de vida para ter a certeza de não perder tempo. Formador ainda é o assistente espiritual.

5. Busca-se a formação cristã, segundo as orientações do Documento de Aparecida. Ali, com efeito, se insiste na formação do discípulo missionário: encontro pessoal e profundo com o Cristo ressuscitado; enveredar pela trilha da conversão (caminho penitencial franciscano); ter senso de Igreja; sair em missão. Os formadores franciscanos haverão de fazer de sorte que esses ensinamentos penetrem os irmãos. Não se trata apenas de um empenho a ser feito na formação inicial, mas em todo o tempo da vida (cf. Documento de Aparecida: O processo da formação do discípulo missionário, 276-285, particularmente 278).

6. Desnecessário dizer que vivemos um tempo de instabilidade e de mudanças profundas na sociedade, na Igreja e em nossa Ordem. Ninguém se forma de uma vez por todas. Estamos em estado de mudança e de permanente revisão da formação. Quais as configurações da Fraternidade Franciscana Secular amanhã? Hoje as coisas parecem ter o gosto do provisório. Precisamos aprender a viver na intempérie. José Arregui, OFM refletindo sobre a problemática da vida consagrada aponta para situações que também vivem os seculares. Nosso destino nestes tempos fragilizados de transição e de incerteza é aprender a viver a espiritualidade do êxodo e da intempérie. Nossa atitude de base é de sofrer a incerteza, perseverar na insegurança. Sinal de maturidade é que aprendamos a suportar a perplexidade, sem adotarmos posição de defesa, nem incorrer na resignação e na amargura. É sadio aprender a viver na intempérie, na incerteza sem ceticismo ou desespero. É sinal de maturidade desaprender muitas coisas, deixar cair o que não tem futuro e não ficar aferrados ao passado. É sadio viver abertos e orientados para o futuro de Deus no mundo, na Igreja, na vida consagrada. É sadio, sobretudo, reaprender a simplicidade da confiança simples, a esperança desnudada (cf. José Arregui, OFM, Ante el futuro de la vida religiosa, in Lumen (Espanha), 2001, p. 201-202. Não existe festa de formatura nem diploma para aqueles que fizeram parte da caminhada da formação. Tudo precisa ser refeito. Necessário seguir em frente. Uma palavra forte: coragem. Uma preocupação: procurar águas mais profundas. Nada de mediocridade e superficialidade. Quais as características da Ordem nos próximos anos? Para onde os ventos sopram?

7. Vivemos numa sociedade movediça, que duvida de tudo e de si mesma, que tem visão “desencantada” do mundo, exprimindo muitas vezes indiferença para todos e para com tudo. Vale tudo. As pessoas empurram as coisas para frente sem muita convicção do que estão fazendo. Será preciso ter confiança no futuro. Os cristãos se contentam com certo verniz de religiosidade. Será fundamental descobrir a própria intimidade. As pessoas estão por demais derramadas no exterior. Há perguntas que precisam ser respondidas: Quem sou eu? A quem pertenço? A quem devo satisfações? O que devo ‘perseguir’ em minha vida? O que significa, efetivamente, ser franciscano secular? Fala-se de uma desorientação identitária. Não existimos para sustentar instituições. Um autor escreve: A busca da própria identidade se converteu em nossos dias, talvez, na tarefa vitalmente mais relevante para a qual, no entanto, não nos sentimos preparados. A palavra é personalização. Levar as convicções ao interior. Na formação se busca levar a processos de interiorização que permitam entrar dentro da própria pessoa e extrair dali o fonte de seu ser. Por meio da interiorização se gera e se robustece a pessoa em bases próprias. Esse processo exige ferramentas básicas imprescindíveis: conhecimento e manejo dos próprios sentimentos, certo grau de contemplação, capacidade de conviver consigo mesmo, cultivo da dimensão do silêncio. A fundação da pessoa é feita de pequenos compromissos que devem desembocar num compromisso vital que leva a uma projeto de vida que, por sua vez, leva à identidade. O primeiro e fundamental dos compromissos é ser cristão.

8. Faz parte da formação uma vivência e prática da oração pessoal de intimidade com o Senhor e uma consciente prática da vida litúrgica. Nutriremos uma paixão esponsal pelo Senhor: oração sólida e suculenta, contato carinhoso com a Palavra do Senhor, sentir a presença do Senhor quando dois ou três estão reunidos em seu nome, descoberta de mestres de oração, retiros que sejam acontecimentos espirituais, familiaridade com os salmos, descoberta da meditação. Necessário que os formandos instaurem o costume da leitura espiritual da vida e de um regular exame de consciência. Até que ponto podemos ajudar os formandos a fazerem uma verdadeira experiência de Deus? Neste contexto de iniciação à oração se deveria destacar elementos da vida e da caminhada de Clara. No final da formação inicial os formandos deveriam ter adquirido gosto pela vivência do tempo litúrgico.

9. Tentemos aqui fazer um elenco sumário de valores humanos: maturidade, coragem, clara noção do que vem a ser assumir um compromisso, superar o universo dos melindres e susceptibilidades, capacidade de conviver com o diferente, capacidade de olhar o que se passa à sua volta, senso de admiração diante das coisas e das pessoas.

10. A formação franciscana vai na linha da impregnação dos valores que marcaram Francisco e Clara:



• postura de simplicidade;
• vida despojada;
• sensibilidade para com o fraterno: amar o irmão como uma mãe ama seu filho;
• não querer sobrepor-se aos outros;
• não apagar a ação do Espírito;
• trabalhar e agir sem perder o espírito da santa oração;
• ir pelo mundo e, ao mesmo tempo, ter saudade do eremo;
• exercitar-se na práxis da desapropriação;
• saber extasiar-se diante de coisas simples: a beleza da natureza, a graça de uma criança;
• saber levar as coisas até o fundo do coração;
• saber que estamos convidados a restaurar a Igreja.

11. Queremos aprender a ser irmãos. “A vocação franciscana é um chamamento para se viver o Evangelho na Fraternidade e no mundo (…). A vida fraterna é resultado de um testemunho humilde e simples; depende da disponibilidade pessoal de morrer como o grão de trigo; é a protelação nunca definitivamente atingida, de um constante heroísmo cotidiano. A vida fraterna se realiza quando deixamos de ser indivíduos e passamos a ser pessoas, ou seja, quando se entra em relação, porque a pessoa nasce e se desenvolve nos relacionamentos, na consciência do próprio valor e no valor dos outros, na reciprocidade do dar e receber, no ter cuidados e no confiar-se, na partilha e na gratidão. A identidade pessoal se adquire nos relacionamentos fraternos. À luz destas perspectivas fundamentais se compreende como, para quem quer fazer parte da Ordem Franciscana Secular, a Fraternidade é um dom que deriva da Profissão, de viver com particular atenção, porque os recíprocos relacionamentos de comunhão tornam-se lugar da própria santificação e do testemunho do amor de Deus que revelado e dado em Cristo. Assim, a Fraternidade se torna indiscutível missão. Portanto, como profissionais da paz e do bem, os Irmãos e Irmãs da Penitência vivem no mundo como fermento evangélico, de modo que os homens, vendo sua vida fraterna vivida no espírito das bem-aventuranças tomem consciência de que já começou em seu meio o Reino de Deus” (Manual para Assistência à Ordem Franciscana Secular e Juventude Franciscana, p. 89-92).

12. A formação, desde o começo, insistirá na formação do candidato na linha de um leigo maduro capaz de dar sua contribuição à missão da Igreja. Os franciscanos seculares são leigos com os quais a Igreja pode contar. Na medida do possível precisam organizar seu tempo que possam atuar, ir pelo mundo, ser Igreja em saída. Há tarefas nas paróquias: catequese, preparação dos moços para a crisma e para o casamento, assistência aos doentes e pastoral da esperança. Tem-se a impressão que há certos campos mais aptos para ação de leigos maduros: a própria família e a evangelização da família, educação, desenvolvimento da consciência política. Já no tempo da iniciação e da formação os candidatos são chamados, de alguma forma, a fazerem a experiências do leproso: visitas e certo convívio com os mais pobres, os doente, os presidiários, os rejeitados. Sem a experiência do leproso a formação ficava deficiente.

13. Nossas fraternidades viverão um clima de profunda alegria. A alegria forma: passa confiança, espanta o desânimo. Esta se manifestará na criação de um espaço de beleza-alegria para a realização de nossos encontros ( imagens e estampas, toalhas, tudo que serve ao altar). Haverá a alegria de jovens, de música, dos filhos e netos. Não haverá de esquecer o ensinamento da perfeita alegria.

14. Benedeto Lino: A formação que realiza um formador é transmissão viva de fé, da descoberta pessoal de Deus que nos transformou em novas criaturas, das verdades que nos abriram os olhos e deram sentido à nossa vida, experiência de viver com Cristo e de Cristo, a beleza de nossa vocação comum, ardor de querer realizar o projeto de Deus a nosso respeito. Ela não é de estilo acadêmico; não é cultura, mas cria. Não é constituída de conferências mais ou menos bem elaboradas, mas impessoais. Não consiste no papel de um manual nem nas luzes e movimentos de um audiovisual, nem é catequese embora a suponha.

15. Perfil do formador segundo um documento Potissimum institutioni (Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e Sociedades de Vida Apostólica): “Bom conhecimento da doutrina católica no que se refere à fé e aos costumes; capacidade humana de intuição e acolhida; experiência de Deus e da oração; sabedoria que seja resultado de atenta e prolongada escuta da Palavra de Deus; amor pela Liturgia e compreensão de seu papel na educação espiritual e eclesial; competência cultural necessária; disponibilidade de tempo e boa vontade para dedicar-se ao cuidado pessoal de cada candidato”.

Conclusão

Formador, equipe de formação, a própria fraternidade vivem estado de formação. José Antonio Merino fala de desafios que franciscanos e franciscanas deverão enfrentar:

retorno a um Evangelho mais puro, levando em conta suas exigências, vivenciar a mensagem de Jesus Cristo, com coragem e alegria;
• estabelecer diálogo entre ateísmo e religião a partir da perspectiva franciscana;
• oferecer pressupostos para a justiça e paz sociais;
• relançar uma cultura e uma mística ecológicas;
• promover valores humanos que levem à ética da frugalidade.

Bibliografia de apoio:

• O que é a formação cristã, e em particular a formação para nós franciscanos seculares – Benedetto Lino, OFS, CIOFS
• Vocazione specifica per uma missione particolare, Benedetto Lino, OFS, CIOFS
• Qu’est-ce que la formation? Anne Mulqueen OFS e Marie-Odile Blanty, OFS, Curso do CIOFS

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